A lição da imprensa portuguesa sobre corrupção e política

Preso desde sexta, ex-chefe de governo não é assunto para seus rivais

Por Pedro Muxfeldt

Detido na sexta-feira, o ex-primeiro-ministro de Portugal, José Sócrates, teve sua prisão preventiva decretada ontem. O antigo líder do Partido Socialista é acusado de fraude fiscal, corrupção e lavagem de dinheiro durante o período em que esteve à frente do país.


Por aqui, a Operação Lava-Jato, da Polícia Federal, já colocou atrás das grades diretores de grandes empreiteiras e ex-funcionários da Petrobras. Políticos implicados nos casos de desvios e propinas na petroleira devem ser os próximos.

Há, porém, uma grande diferença entre os dois casos. Enquanto no Brasil, a oposição e a mídia, que é mais oposição que os próprios tucanos, fazem um escarcéu a cada denúncia, tentando colar o escândalo nas gestões petistas, na velha metrópole, o clima é de moderação nos comentários.

E a explicação nada tem a ver com um sentimento de autoproteção por parte dos grupos adversários dos socialistas, que poderiam também estar envolvidos em outros esquemas de corrupção.

Ao não explorar as notícias recentes, líderes do Partido Social Democrata, atualmente no poder, produzir o tal ambiente de mar de lama buscado pelas oposições brasileiras que depõem contra a política como um todo.

Eles sabem que a falta de credibilidade das instituições abre espaço para líderes sem apreço pelos valores democráticos, que ascendem com o discurso de "limpeza", "contra tudo que está aí".

E quanto à imprensa? A princípio, também cabe a ela lutar pela democracia. No Brasil, contudo, a mídia é a principal propulsora do discurso anti-política. Este lhe serve na medida em que permite aos meios de comunicação se colocarem como mediadores do debate público e únicos bastiões da moral e da ética frente às ratazanas de Brasília. Nada mais falso.

Nesse sentido, o editorial de hoje do Diário Econômico, jornal português, é uma lição e tanto nos nossos barões da mídia e na oposição mais raivosa. Colocar a Política e a Justiça em xeque só serve como brecha ao fascismo e falsos moralistas como Berlusconi. A quem isso interessa?

Confira a íntegra do editorial (aqui, o original).

A tentação de politizar o caso José Sócrates

"Até quando resistirão o Governo, a maioria que o suporta e o PS à tentação de jogar politicamente com o caso judicial que envolve um ex-primeiro-ministro? A tentação significa coisas diferentes para os dois lados da barricada política.

"Para o Governo e a maioria é disparar sobre o carácter de José Sócrates e colar o que se vai sabendo - em parte através de fugas para os jornais - à liderança de António Costa. Para o PS é atacar o funcionamento da Justiça, acusando as instâncias judiciais de combate político.

"Dos dois lados da barricada política as primeiras ordens foram para guardar um silêncio prudente, mas a tentação fervilha (exemplo: a frase “os políticos não são todos iguais”, dita por Passos Coelho num contexto que nada tinha a ver com o caso Sócrates, é uma escolha desastrada de palavras ou uma referência indirecta perigosa).

"Nos próximos meses, o desafio maior das lideranças políticas no PSD, PS e CDS será, por entre inevitáveis episódios negativos, manter uma disciplina geral sobre tão delicado tema.

"Todos têm um incentivo: se usarem armas químicas contra o outro lado estarão degradar a política e a Justiça, minando um regime que lhes entrega rotativamente o poder, em prol de algo que pode ser pior (como se vê em Itália). Até quanto tempo resistirão? O país só deve ter uma resposta: todo o tempo que seja necessário."

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