Cuba, Estados Unidos e a visão torta sobre democracia

Acerto de ontem significaria chegada da democracia à Cuba
Por Pedro Muxfeldt

O histórico restabelecimento das relações diplomáticas entre Cuba e Estados Unidos, anunciado ontem pelos presidentes dos dois países trouxe à tona muitas questões. Em todos os jornais e portais, análises e entrevistas tentam dar conta das mudanças que podem ocorrer na ilha e no mundo após o 17 de dezembro.


Entre a grande imprensa, porém, uma visão se impõe. O acordo de ontem e um possível - mas não provável - fim do embargo econômico seriam passos decisivos para a chegada dos ideais democráticos à ilha de Fidel e Raúl. Contudo, que democracia é essa defendida pela mídia e abraçada por Obama em seu discurso?


Há décadas, os Estados Unidos agem como polícia do mundo sob o argumento de que fazem a defesa da democracia. Iraque, Líbia, El Salvador, Brasil e Chile - para ficar em poucos exemplos -  foram todos alvos de ações diretas ou indiretas dos norte-americanos após pseudoameças à democracia, seja pela possibilidade da ascensão do comunismo seja pela presença de governos tirânicos.

Em todos estes lugares, a defesa do "governo do povo" pelos Estados Unidos desembocou em ditaduras, barbárie, países esfacelados e sem ordem. Em todos esses lugares, também, quem mais lucrou foi o complexo industrial-militar norte-americano, explorando poços de petróleo, destruindo a infraestrutura nacional via privatizações e outras medidas.

Esta é a democracia que interessa aos Estados Unidos, sempre um túmulo sobre a ditadura na Arábia Saudita ou o genocídio palestino perpetrado por Israel, seus dois fiéis escudeiros. A democracia que abre portas para empresas e negócios ianques e deixa sempre um rastro de destruição pelo caminho.

Por outro lado, a expectativa da mídia de que a democracia aporte em Cuba também não se sustenta no outro lado da moeda, o que diz respeito ao sistema político na ilha. Apesar de não ter eleições diretas para presidente, o povo cubano é instado a opinar sobre todas as grandes decisões políticas e econômicas do país.

As reformas econômicas propostas por Raúl Castro a partir de 2008, por exemplo, passaram anos sendo debatidas por todo o país e inúmeras sugestões surgidas nestes encontros foram acatadas pelo governo. Há décadas, foi também o povo que definiu que o compromisso do governo cubano de manter a seguridade social, saúde e educação acima de qualquer coisa.

Num momento onde a democracia representativa mostra todos os sintomas de apodrecimento no Brasil e em outras partes do mundo, é no mínimo curioso que a mídia envide esforços para que o sistema seja adotado também em Cuba.

Nessa discussão sobre o conceito norte-americano - e também midiático - e o cubano de democracia cabem algumas perguntas. Qual país é mais democrático? O que garante saúde e educação gratuita e de qualidade ou o que mantém uma prisão em terras estrangeiras? O que zerou o analfabetismo há décadas ou o que fez da tortura política de Estado nos últimos anos? O que mantém médicos em mais de 66 países ou o que mata a sua juventude negra e inocenta os assassinos brancos?

Nenhum comentário:

Postar um comentário