Por audiência, Band esquece de fazer jornalismo em debate

Formato de 'embate direto' do debate da Band deixa jornalismo de lado

Por Matheus Quelhas

Após o debate presidencial desta quinta-feira, na TV Bandeirantes, segue-se a tradicional entrevista pós-debate, ainda no estúdio, e os repórteres: “Qual foi seu sentimento sobre o debate?”, “Você acha que ganhou o debate?”, “A temperatura subiu, outras horas desceu, o que achou disso?”.

No momento seguinte, o mediador Ricardo Boechat se vangloria. “Acho que se somarmos o tempo de fala do mediador não dá três minutos. E acho que essa é a melhor forma para se estimular o debate como foi”. Com muito ‘embate direto’, segundo o colega de emissora.

Esse foi o ponto em que eu, jornalista por exercício antes de jornalista formado (como grande parte dos colegas) me questionei sobre a tal forma. Momento este que deve chegar a todos que refletem sobre comunicação no Brasil. Melhor forma para quê?

Para produzir uma centena de manchetes em sites, que geram cliques e mais publicidade? Ou para gerar audiência para emissora, pois ninguém quer perder a próxima careta, deboche ou piadinha do candidato adversário? Quem sabe ainda a repercussão destes nas redes sociais, um comentário preconceituoso, contrário ou a favor - se for famoso melhor ainda -, gera mais uma notinha, mais buzz.  

Melhor forma pra quem? Para candidato da situação que não consegue rebater a não execução de orçamentos e não tem resposta para a inexplicável inércia em avanços e reformas estruturais após 12 anos de governo de esquerda? Ou para candidato que pode colocar o dedo em riste a qualquer momento, usar o nome de Eduardo Campos e ignorar o tema da pergunta (porque não existe delimitação)?

Ainda na entrevista com Boechat, o repórter questiona o "disse me disse" entre os candidatos e o estímulo ao acesso a sites de ambos os lados. Enquanto Dilma indicou o Tribunal de Contas de Minas Gerais, Aécio foi claro: “acessem o site do partido”. Mas aparentemente as cartas que pulularam das mangas dos candidatos não estavam no radar dos jornalistas. "Sim, realmente acho que tem que haver esse movimento por parte dos eleitores", responde prontamente o âncora, estimulando uma apuração. 

Ora, mas então para quê jornalista metido nesse negócio de cobertura de eleição? Basta dar a palavra aos políticos e aguardar que o público cheque todas as informações, a credibilidade das fontes, e quem sabe eles mesmos passem a levantar questionamentos diretamente aos candidatos, por mensagem nas redes sociais, e-mail, e então se esgotará oficialmente o papel do jornalista, que se limitará a ser um bom redator (quando for)?

Não se trata de não estimular a democratização da informação e a leitura crítica dos discursos midiáticos (incluso aí o próprio jornalismo), mas sim de resgatar e exigir que a essência da profissão seja protagonista em seu exercício.

Sim, é óbvio que num debate o mediador deve ter uma participação reduzida, mas discordo radicalmente do modelo deste primeiro debate. Um formato que deixa espaço para propaganda eleitoral ao vivo, repetitiva e rasa - como já é quando gravada, revisada, estudada, decorada. Só que pior, pois deixa um imenso convite à desinformação, incentiva estratégias de convencimento em detrimento da discussão aprofundada de ideias, programas e principalmente contradições. Sim, elas existem em ambos os lados, às centenas (do lado do atual governo menos do que no lado tucano, que fique claro).

Será que não houve tempo para checar uma informação dada no primeiro bloco para questioná-la na entrevista depois? Será que não nenhum dos profissionais teve tempo de confrontar dados antes, para já tê-los à mão? E vamos além, talvez ao mais importante: será que as empresas de comunicação têm interesse nesse tipo de debate profundo e dão as condições necessárias de trabalho para os colegas jornalistas?

O baixo nível da campanha – reiterando, em termos de discussão de ideias (ideais, num sonho distante) – não foi rechaçado pela maioria da imprensa. Ao contrário, foi comprado e segue sendo empacotado em pílulas de escândalos, publicados em lotes de acordo com a conveniência dos setores mais influentes nas grandes empresas de comunicação. A maior parte da imprensa escolheu “pairar sobre o espectro político, se colocando como o grande receptáculo de moral e ética da sociedade”, nas palavras do amigo jornalista Pedro Muxfeldt.

Será que o repúdio evidenciado nas manifestações de junho de 2013 aos grandes conglomerados era mero “orgulho juvenil” (como um eleitor de Aécio definiu o não direcionamento das revoltas populares em votos ao tucano)? Ou existe uma massa cada vez mais descrente no tipo de jornalismo que vem sendo feito?

Há de se repensar por dentro, olhando para o mundo que nos questiona, antes que a total falta de credibilidade nos atinja. E repensar significa necessariamente exigir a democratização dos meios de comunicação, incluindo aí uma revisão periódica das concessões públicas. Será que esse tema surgirá em algum momento desse segundo turno? Desconfio que não.

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